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Monitoração Eletrônica e Medidas Protetivas na Lei Maria da Penha: O que muda com a lei 15.125/2025?

A Lei 15.125/2025 incluiu a monitoração eletrônica como medida complementar às protetivas de urgência da Lei Maria da Penha. O artigo destaca os fundamentos legais, as diferenças em relação ao CPP, as formas de aplicação e os desafios para sua efetiva implementação.

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A violência doméstica e familiar contra a mulher é uma das mais graves violações de direitos humanos, e combater esse fenômeno exige um aparato jurídico ágil, eficaz e comprometido com a proteção integral da vítima. Nesse contexto, a recente Lei 15.125/2025 representa um avanço ao incluir de forma expressa a possibilidade de cumulação entre medidas protetivas de urgência e a monitoração eletrônica do agressor.

O papel das medidas protetivas de urgência

As medidas protetivas de urgência, previstas nos artigos 22 a 24 da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), têm por objetivo interromper o ciclo de violência e proteger imediatamente a mulher em situação de risco. Entre as medidas mais comuns estão o afastamento do agressor do lar, a proibição de aproximação ou contato com a vítima, e a suspensão do porte de armas.

No entanto, a efetividade dessas medidas sempre enfrentou um problema prático: como fiscalizar seu cumprimento? Como garantir que o agressor, de fato, manterá distância, sem mecanismos de vigilância ativl.

A evolução da monitoração eletrônica no ordenamento jurídico brasileiro

A monitoração eletrônica foi inicialmente introduzida com a Lei 12.258/2010, que modificou o Código Penal e a Lei de Execuções Penais, permitindo seu uso para o monitoramento de condenados. A Lei 12.403/2011, por sua vez, incluiu expressamente a monitoração eletrônica como medida cautelar diversa da prisão (art. 319, IX, do CPP), ampliando seu uso para o período processual, mesmo antes da condenação.

Assim, a monitoração eletrônica passou a figurar no ordenamento como um instrumento de vigilância não privativa de liberdade, aplicável a investigados e réus, inclusive no contexto da violência doméstica.

Antes da Lei 15.125/2025: prática judicial e interpretação integrativa

Mesmo sem previsão expressa na Lei Maria da Penha, a prática judicial já autorizava a imposição de monitoração eletrônica com base na intercambialidade das medidas cautelares do CPP com as medidas protetivas da LMP. Essa tese é defendida por autores como Renato Brasileiro, que reconhece a possibilidade de o juiz aplicar medidas do art. 319 do CPP sempre que as medidas protetivas da LMP forem insuficientes.

Além disso, o próprio art. 22 da LMP, ao utilizar a expressão “dentre outras”, admite um rol aberto de medidas, dando base ao chamado princípio da atipicidade das medidas protetivas de urgência, o que legitima interpretações ampliativas, sempre visando à máxima proteção da vítima.

O que diz a nova redação da Lei Maria da Penha?

A Lei 15.125/2025, publicada em 24/04/2025, acrescentou uma nova redação ao § 5º do art. 22 da LMP, estabelecendo que:

“Nos casos previstos neste artigo, a medida protetiva de urgência poderá ser cumulada com a sujeição do agressor a monitoramento eletrônico, disponibilizando-se à vítima dispositivo de segurança que alerte sobre sua eventual aproximação.”

Essa previsão reforça o entendimento de que a monitoração eletrônica pode ser determinada judicialmente como instrumento acessório às medidas protetivas, com o uso de tornozeleiras eletrônicas no agressor e de dispositivos de alerta (como os botões do pânico) para a vítima.

Monitoração eletrônica como instrumento acessório, e não autônomo

A nova lei deixa claro que a monitoração eletrônica não é uma medida protetiva autônoma, mas sim um instrumento de fiscalização complementar às medidas já previstas no art. 22. Se o juiz aplicar, por exemplo, o afastamento do lar ou a proibição de aproximação, poderá cumulá-las com o monitoramento eletrônico, mas não poderá aplicar apenas a monitoração eletrônica isoladamente com base na LMP.

Diferença entre o monitoramento do CPP e da LMP

A distinção entre os dois regimes pode ser sintetizada da seguinte forma:

AspectoCPP (Art. 319, IX)LMP (Art. 22, § 5º)
Pode ser autônoma?SimNão
FinalidadeGarantir a instrução e aplicação penalProteger a vítima e dar efetividade à MPU
Descumprimento da monitoraçãoPode gerar nova cautelar ou prisãoGera descumprimento da MPU vinculada
Fundamento legal da prisão preventivaArt. 282, § 4º, CPPArt. 20 da LMP c/c art. 313, III do CPP

Modalidades de monitoração: zonas de exclusão e inclusão

A monitoração eletrônica pode ser determinada pelo juiz em duas modalidades principais, que podem inclusive ser combinadas:

1. Zona de exclusão

Define os locais onde o agressor não pode entrar, como a casa da vítima, o trabalho, a escola dos filhos etc. A violação da zona gera alertas automáticos para as autoridades e para a vítima.

2. Zona de inclusão

Define onde o agressor deve permanecer, como em casa à noite ou no trabalho durante o dia. Essa modalidade também pode servir à fiscalização de obrigações terapêuticas ou educativas, como a frequência a grupos de apoio ou programas de reeducação (art. 22, VI e VII da LMP).

A importância da tecnologia para o controle e a prevenção

O uso conjunto da tornozeleira e do botão do pânico fortalece a rede de proteção à vítima e permite uma atuação mais rápida e coordenada das forças de segurança, caso haja risco real. Além disso, a monitoração cumpre uma função pedagógica e disciplinadora, podendo contribuir para a ressocialização do agressor, quando acompanhada de medidas terapêuticas.

Desafios práticos de implementação

Apesar do avanço legal, a efetividade da monitoração depende de fatores estruturais, como:

  • Equipamentos em número suficiente (tornozeleiras e dispositivos de alerta);
  • Centrais de monitoramento que funcionem 24 horas;
  • Protocolos claros de atuação em caso de violação;
  • Integração entre Judiciário, Ministério Público, Defensoria e polícia;
  • Capacitação técnica dos profissionais envolvidos.

Conclusão: da prática à política pública

A Lei 15.125/2025 não apenas legitima uma prática que já era adotada por alguns magistrados, como também eleva a monitoração eletrônica à condição de política pública nacional no enfrentamento à violência doméstica.

Com essa mudança, espera-se maior padronização entre os Estados, mais segurança para as vítimas e mais responsabilidade para os agressores. Trata-se de um passo importante rumo à efetividade das medidas protetivas, integrando tecnologia, proteção e responsabilização.

Referências:

  • LIMA, Renato Brasileiro. Código de Processo Penal Comentado, Juspodivm, 2017.
  • NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado, Forense, 2022.
  • HEEMANN, Thimotie Aragon; CUNHA, Rogério Sanches. Monitoramento “front door” e Lei Maria da Penha, JusPodivm, 2025.

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